A manifestação compõe a agenda coletiva de atividades da 5ª edição do Março de Lutas; Além de Salvador (BA), foram registrados atos em João Pessoa (PB) e Teresina (PI)
Redação Odara
No final da tarde da última terça-feira (21), data em que se celebrou o Dia Internacional de luta contra a Discriminação Racial, ativistas de 15 organizações dos movimentos sociais baianos se reuniram na Praça da Piedade, em Salvador (BA), para pedir reparação à comunidade negra diante dos efeitos letais do racismo e violência de Estado.
O ato faz parte da agenda coletiva de atividades da 5ª edição do Março de Lutas, que em 2023 traz o tema “Reparação no Brasil: O que as mulheres negras estão pensando?”. A partir desse mote, ativistas dos movimentos de mulheres e juventudes negras, juristas negras e negros e pesquisadores da área da segurança pública, com suas vozes e cartazes, denunciaram as mortes de crianças e jovens negros praticadas pela polícia, o alto índice de feminicídios que atinge sobretudo as mulheres negras e o racismo religioso que vitimiza as comunidades de religiões de matriz africana.
“A gente quer que as famílias e comunidades negras que vêm sofrendo historicamente com esse genocídio possam ter reparação. O Estado tem essa dívida e é necessário que a gente lute por isso”, afirmou Hildete Emanuele Nogueira, coordenadora do projeto Minha Mãe Não Dorme Enquanto Eu Não Chegar, do Odara – Instituto da Mulher Negra. Hildete destacou ainda a presença marcante da juventude na manifestação. “A juventude precisa estar no centro desse debate, porque a maioria dos que estão morrendo são os jovens negros de 15 a 29 anos das nossas periferias”, disse.

Beatriz Santana, jovem que faz parte do Centro de Referência Integral de Adolescentes (CRIA), ressaltou que além das mortes diretas praticadas pelo Estado contra a juventude negra, outras violações de direitos também impactam a experiência dessa juventude. “Não é só pela bala que atravessa o nosso corpo. É quando o Estado nega o direito de uma educação com qualidade, quando não constrói um espaço de lazer. Esse Estado nos mata a partir do momento que nos é negado o direito de sonhar”, afirmou.
Nadijane Macedo, mobilizadora do projeto Minha Mãe Não Dorme e mãe do estudante Alexandre Macedo, de 17 anos, morto pela polícia em 2008, relembrou o caso do seu filho e falou da importância de continuar lutando por justiça. “São 15 anos sem meu filho. Foi muita luta para conseguir levar os policiais responsáveis a júri popular. Mas eu não falo só por Alexandre, falo por tantos outros jovens que foram mortos. Como sociedade, nós não podemos aceitar”, enfatizou.

Nadijane e outras mães de vítimas do Estado exibiram cartazes com fotos de suas filhas e filhos | Foto: Thiancle Carvalho
Belle Damasceno, pesquisadora da Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas, falou sobre o papel da política de guerra às drogas na manutenção do extermínio da juventude e violência contra as comunidades negras. “A política de drogas, vai além do conceito de necropolítica, porque é sobre a impossibilidade de vidas existirem. É ela que faz o seu bairro ser desvalorizado porque não tem posto de saúde, não tem equipamentos públicos de cultura”, afirmou Belle.
Mesmo embaixo de chuva, os manifestantes ocuparam a Praça da Piedade até às 19h. O ato foi finalizado com uma intervenção poética do Coletivo Incomode. “Quem disse que a gente não é gente?”, questionava um dos poemas recitados.

Além de Salvador, foram registrados outras manifestações públicas em alusão ao Dia Internacional de luta contra a Discriminação Racial em João Pessoa (PB) e Teresina (PI).
O “Ato público pela vida do Povo Negro: Reparação já!” foi articulado pelo Odara – Instituto da Mulher Negra, em parceria com a Associação das Comunidades Paroquiais de Mata Escura e Calabetão (ACOPAMEC), Instituto Fogo Cruzado, Coletivo Incomode, CIPÓ – Comunicação Interativa, Centro de Referência Integral de Adolescentes (CRIA), IDEAS Assessoria Popular, Centro de Arte e Meio Ambiente (CAMA), Grupo Mulheres em Luta, Grupo de Mulheres Negras do Alto das Pombas (GRUMAP), Koinonia Presença Ecumênica e Serviço, Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas, Juventude Ativista de Cajazeiras (JACA), Associação Artístico Cultural Odeart, Mandata Pretas por Salvador e Tamo Juntas.
Sobre o Março de Lutas
O Março de Lutas surge como uma agenda coletiva para reafirmar a resistência negra no Brasil, visibilizar o protagonismo das mulheres negras brasileiras no compartilhamento de práticas e experiências de autonomia e liberdade da população negra, e viabilizar denúncias de enfrentamento ao racismo, sexismo e lesbitransfobia, que impactam a vida das pessoas negras, especialmente as mulheres.
Criado em 2019 pelo Odara – Instituto da Mulher Negra, a agenda segue sendo anualmente organizada pela Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB) e pela Rede de Mulheres Negras do Nordeste. O tema desta edição é “Reparação no Brasil: O que as mulheres negras estão pensando?”.